Vale tudo na hora de empreender? Não é bem assim
Desde que decidiu empreender vendendo sanduíches naturais na praia, no Rio de Janeiro, Raquel Acioli, personagem da atriz Taís Araujo, da novela “Vale Tudo” (TV Globo), segue por um caminho de riscos, aprendizados e reviravoltas.
Sem pesquisa de mercado, planilhas de custos ou mapeamento de fornecedores, a protagonista mergulhou no universo do empreendedorismo movida pela necessidade.
Dados da edição mais recente (referente a 2024) do Global Entrepreneurship Monitor (GEM), principal pesquisa sobre empreendedorismo no mundo, mostram que 34,3% dos brasileiros consideram que abrir um negócio próprio está entre os seus três principais sonhos, atrás apenas de ter a casa própria e viajar pelo país.
A categoria “alojamento e alimentação”, na qual se encaixaria a personagem de “Vale Tudo”, é a segunda atividade com mais empreendedores no Brasil, com 11% de participação, atrás apenas de “comércio; reparação de veículos automotores e motocicletas”.
O QUE RAQUEL TEM A VER COM A REALIDADE BRASILEIRA
Assim como Raquel, que chegou no Rio sem ter como se manter, cerca de 45% dos brasileiros entrevistados para a formulação do GEM começaram um negócio forçados pela necessidade. Esse percentual aponta um crescimento em relação ao levantamento de 2023 (38,6%).
O monitor, que tem o Sebrae como parceiro no Brasil, aponta que a opção “ganhar a vida porque os empregos são escassos” registrou, em 2024, a menor proporção da sua série histórica.
A participação de 73,9% mostra que a dinâmica empreendedora no Brasil tem se modificado nos últimos anos, “com o desemprego perdendo força e o desejo de empreender (fazer diferença e ganhar mais) ganhando força no quadro de motivações.
POR QUE O BRASILEIRO VIRA EMPREENDEDOR?
As quatros principais razões mencionadas pelos empreendedores para iniciar o negócio são para “fazer a diferença no mundo” (74,6%), “ganhar a vida porque os empregos são escassos” (73,9%), “construir uma grande riqueza ou uma renda muito alta” (69,3%) e “continuar uma tradição familiar” (35,4%).
cerca de 45% dos entrevistados para a formulação do GEM começaram um negócio forçados pela necessidade.
Outra semelhança entre os novos empreendedores entrevistados em 2024 e Raquel na fase dos sanduíches naturais é que ela, se não fosse personagem de novela, faria parte de uma maioria que não correu atrás da formalização do negócio. Segundo o GEM, apenas 38,6% obtiveram o CNPJ no ano passado, uma média inferior aos 42,2% de 2023.
De qualquer forma, não se espera que se chegue a 100% de empreendimentos formalizados, pois o GEM inclui em seus critérios aqueles em estágio nascente – ou seja, os que ainda estão em fase de instalação e/ ou funcionando há no máximo três meses.
EQUILIBRANDO PAIXÃO E SUSTENTABILIDADE DO NEGÓCIO
Logo no início da trajetória empreendedora, Raquel investiu em ingredientes caros e saiu vendendo “no achismo”, baseada em uma espécie de sexto sentido combinado com a urgência da falta de dinheiro, Nada de planilha para definir preço de custo e margem de lucro mínima.

Começar um negócio sem pesquisa de mercado, mapeamento de fornecedores e controle de preços pode resultar em margens apertadas e alto risco de endividamento, explica Roberta Andrade, diretora de educação corporativa da Friedman by Gouvêa Ecosystem.
Para Marcus Rizzo, diretor da Rizzo Franchise, quem empreende de forma pura não planeja, apenas faz. “Mas correr sem olhar para trás pode custar caro quando as despesas fixas (aluguel, folha de pagamento, entre outras) se tornam incontroláveis”, lembra.
Assim, quem se dispõem a empreender tem que achar resposta a uma série de questões:
O que oferecer aos clientes
Vale mais a pena apostar em um só tipo de produto ou é melhor diversificar para tentar agradar a mais clientes? Não há uma resposta fechada de certo ou errado, vai depender da estratégia a ser adotada.
Como organizar o trabalho

Quando começou a vender sanduíches na praia, Raquel fazia tudo sozinha. Isso pode ser necessário no início, mas o ideal é que o empreendedor divida a carga de trabalho com sócios ou colaboradores.
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Não ficar na “mesmice”
Raquel não tem medo de experimentar novas receitas e combinações. É importante inovar, mas sem perder de vista a geração de receita nem esgotar o caixa para criar as novidades.
Aprender com os números
A trajetória de Raquel mostra que coragem sem controle financeiro não sobrevive: “o instinto dá impulso, mas só os números tornam o negócio sustentável”, resume Roberta. É preciso cuidado extra no cálculo de despesas, na precificação e nas estimativas de vendas.

O QUE PODEMOS APRENDER COM RAQUEL
– Planejamento contínuo: não basta um plano inicial é preciso revisá-lo periodicamente;
– Profissionalização: adotar CNPJ, fluxo de caixa e metas claras;
– Endividamento consciente: só com projeções de vendas e prazos definidos;
– Teste e feedback: ajustar produto e preço em pequena escala;
– Instinto + números: paixão e dados, juntos, moldam negócios duradouros.
Com esses aprendizados em mente, qualquer empreendedor pode seguir o exemplo (e os alertas) de Raquel para transformar coragem em crescimento sólido.